quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

As Minhas Fitas #2

"Um Caso Real" ( A Royal Affair)


Este filme de 2012, uma co-produção entre Alemanha, Dinamarca, Suécia e Republica Checa, conta a historia real da rainha Caroline Mathilde da Dinamarca. Ela era uma princesa inglesa que foi casar com o Rei Christian VII, claramente com perturbações mentais. 
À sua madrasta, Julianne, convinha que ele não se comportasse como um rei, pois queria pôr o seu meio-irmão no trono, ficando ela como regente. Christian é um fantoche na mão do seu conselho privado.

Caroline parte com ilusões de amor e de um marido compreensivo, mas a realidade choca com o que ela pensava que iria ser a sua vida de casada. Apesar de ser um casamento arranjado, onde o amor não é para aqui chamado, ela construiu uma imagem a partir do que os conselheiros de Christian disseram aos seus pais, aquando do noivado e respetivo contrato de casamento. Ela vê-se num país estranho, com gente estranha e não muito amigável e o  que é pior - o seu marido é dado a explosões temperamentais repentinas,  prostitutas, álcool e devassidão no geral. Ela prepara-se para sofrer em silêncio - ou tão silenciosamente quanto possível - com o seu primogénito Fredrik.


Eis que o jogo se altera com a entrada em cena do Dr. Johann Struensee, um médico avançado para a sua época, que conseguiu compreender o que Christian precisava e conseguiu estabilizá-lo.


Mas, ele é um homem do Iluminismo, numa altura em que ser Iluminista queria dizer ideias progressivas, normalmente relacionadas com uma certa agitação política (que mais tarde, iria conduzir à Revolução Francesa) mas, que quando o filme começa ainda são só tidas por ideias subversivas. Ele tem livros proibidos, que começa a emprestar à  rainha. Ela, a principio desconfiada e nada apostada em dar confiança àquela personagem, acaba por amolecer, mais por causa da sua solidão, e ao compreender o tipo de poder que aquele homem tem sobre o seu marido.


Então, ela e Struensee, começam a industriar Christian para que, a coberto do que ele pensa ser por sua iniciativa, ele comece a implementar as mudanças políticas e sociais de que o país necessita desesperadamente.
E no meio desse processo, eles apaixonam-se. Vai ter consequências nefastas para todos, mas penso que o final foi redentor. É um filme onde se vê muito bem os meandros do poder, pela parte de quem o exerce e por quem o quer vir a exercer.


Com interpretações fantásticas de Alicia Vikander e de Mads Mikkelsen, este filme europeu tem toda a qualidade e sensação "europeias" - excelência nos  diálogos e atuações fabulosas onde mais do que o bom aspeto dos atores, conta a sua capacidade de "vestir" a personagem e levá-la mais além. Sentimos tudo: as humilhações de Caroline, as incertezas, a solidão, mais tarde a paixão, a sensação de poder e depois de perda.
Um pedaço interessante de trivia: Alicia Vikander teve que aprender dinamarquês e todo o filme foi rodado desta língua, apesar da língua que a corte usava nesta altura seria o alemão. O dinamarquês era considerado a língua do povo.


E vocês - já viram? Digam-me tudo.


Kisses da vossa Geek

domingo, 29 de janeiro de 2017



Opinião O Labirinto dos Espíritos



"A maior parte de nós, os mortais, nunca chega a conhecer o seu verdadeiro destino. Somos apenas atropelados por ele. Quando erguemos a cabeça e o vemos afastar-se pela estrada já é tarde, e o resto do caminho temos de fazê-lo pela valeta daquilo a que os sonhadores chamam a maturidade. A esperança não mais é do que a fé em que esse momento não tenha ainda chegado, que consigamos ver o nosso verdadeiro destino quando se aproximar de nós e saltar para bordo antes que a oportunidade de sermos nós mesmos se desvaneça para sempre e nos condene a viver de vazio, com saudades do que devia ter sido e nunca foi."



Como começar a opinião de um livro de 848 paginas, que não me deixou "pousada" um instante que fosse?


As emoções foram muitas, neste que é o último livro da (agora) tetralogia O Cemitério dos Livros Esquecidos. Foi um livro intenso, cuja ação não pára de nos dar voltas e twists vários e cuja escrita do autor nos envolve totalmente no ambiente de Barcelona, de finais dos anos 50.


Temos uma breve introdução, que nos vai situar em finais dos anos 30 e com o bombardeamento de Barcelona, altura em que Alicia Gris, uma criança perdida, é gravemente ferida.
A ação depois desloca-se para finais dos anos 50, acompanhando os Sempere, que nesta altura já tem o avô Sempere, o Daniel e a Bea casados e o pequeno Julián, nomeado como o autor do livro A Sombra do Vento, o qual propiciou os seus pais se conhecerem.
Em Madrid, acompanhamos Alicia e o seu mentor, Leandro Montalvo, naquilo que se poderia chamar os primórdios de um serviço de espionagem. Ela e Leandro ,em conjunto com outros agentes, trabalham na sombra para que a Espanha do Generalíssimo não se desintegre mais depressa do que seria expectável.


Tudo começa com o desaparecimento misterioso do ministro Maurício Valls, pessoa muito querida do regime. Ele desaparece um dia, deixando a sua filha Mercedes com um recado ininteligível e a sua esposa gravemente doente. Alicia e Leandro vão ser postos na pista do ministro, para perceber o que se passou e mais importante ainda - recuperá-lo com vida.


Com uma mudança de cenário para Barcelona começa, mais uma vez, o enredo a centrar-se no Cemitério dos Livros Esquecidos. Esse local mágico, onde todos os livros em perigo de desaparecerem encontram o seu lugar e protetor. É claro que os Sempere vão estar no centro da ação, com Alicia Gris, uma femme fatale com vingança no pensamento e rancor no coração, com Fermín Romero de Torres com a sua famosa verborreia, a sua Bernarda e todos os que moram nas redondezas da livraria Sempere e Filhos.
É uma narrativa que vai ter como livro de partida Ariadna e o Príncipe Escarlate de Vitor Mataíx, outro dos autores malditos daquela Barcelona dos anos 20/30,  um grande amigo de David Martín e que acabou por ser também seu companheiro de cela.


Este é um livro que nos faz devorar todas as páginas com igual interesse, não havendo momentos mortos nem quebras de ritmo, o que para um livro tão extenso até seria normal. É aqui que os grandes escritores se distinguem - quem consegue prender a atenção de um leitor sem se perder pitada de emoção ao longo de mais de 800 paginas tem que ser um escritor de exceção.
A escrita de Carlos Ruiz Zafón é como sempre clara, concisa e direta mas com o seu toque de sarcasmos e humor negro que acho delicioso.


" Que se afaste ou ver-me-ei na dolorosa necessidade de catapultar-lhe o saco escrotal até ao pescoço com uma joelhada"


Esta citação, entre muitas que poderia pôr da minha personagem mais querida, que é claro Fermín Romero de Torres, ilustra bem o tipo de humor e linguagem utilizada pelo autor. Mas todos, em maior ou menor grau são igualmente inteligentes. Os diálogos são fluidos, cheios de vivacidade que dá vontade de conhecer aquelas pessoas na vida real.
As personagens são ricas, densas, torturadas, com segredos, vergonhas, triunfos, baixezas - tudo o que o ser humano experiencia na sua vida.

Também a descrição de Barcelona e dos seus ambientes, nos transporta até lá de tal maneira que sentimos os cheiros, vemos as cores, andamos pelas Ramblas, subimos na Avenida Tibidabo e isso é uma absoluta delícia.


E vocês, já leram este livro? O que acharam?


Kisses da vossa Geek